Eu tinha 13 anos quando o governo de Vichy se instalou no castelo. Morávamos num anexo reservado para empregados, no caso meu pai era professor dos príncipes. Coisas estranhas aconteciam na cidade enquanto a vida cotidiana continuava mais ou menos normal. Eu descia o morro de trenó até a escola. Foi assim que dei de cara com umas pessoas que nunca havia visto na vida. Eles usavam roupas esquisitas e tinham a pele queimada de sol. Andavam carregando armas e bodes cheios de sinos pendurados. Um dia me deram uma pá e falaram: “vá, abra as valas com força e ânimo”. Eu joguei a pá na floresta e fui brincar. Dias depois os aviões chegaram, voavam baixinho para burlar os radares, iam leves quase encostando no chão. De repente começava aquela rajada de balas alcançando qualquer ser vivo que se movesse. Aí eu descobri a razão das valas, era para lá que corríamos, nos deitávamos e esperávamos que não houvesse mais nenhum barulho do motor dos aviões. Fora isso, a vida corria normalmente. Até o dia que levei o maior susto de minha vida com os negros armados carregando facões entre os dentes. Estávamos todos no bunker do castelo, um túnel aberto nas rochas. De repente eles entraram! Nunca tinha visto um negro na vida e nem sabia que eles existiam. Todos tinham facões enormes. Diziam que cortariam nossas cabeças. Eu os olhava maravilhado, gente com outra cara tão diferente como personagem de um livro. Eram os senegaleses. Não só não cortaram nossas cabeças como foram gentis conosco. Nunca me esqueço da cara deles. Altos. Bonitos.
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