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Civilidade

26 Apr

O homem fez uma sessão de exercícios na piscina com a ajuda de uma pequena bóia que circundava seu tronco. Terminada a sessão, apoiou os braços na borda da piscina. Testou a própria força. Retornou. Fez o mesmo movimento mais duas vezes. Com o rosto vermelho, aparentando uns setenta anos, ergueu-se com a força dos braços e como uma sereia, movimentando o tronco ainda protegido pela bóia, ficou na beira da piscina a ajeitar o corpo. Com esforço enorme, visível em seu rosto, sentou no banco de madeira que circula a piscina. Respirou fundo várias vezes. Alongou os braços. Secou a perna amputada e a perna sem movimentos. Respirou fundo mais algumas vezes. Puxou a cadeira de rodas para perto de seu corpo e com força máxima nos braços, passou do banco para o assento móvel. Foi embora.

Isso aconteceu ontem na piscina pública de Wettingen. É uma cena muito comum na Suíça. Se tem algo a se admirar na Suíça é a acessibilidade. Uma vez uma brasileira, de passagem por aqui, comentou que nunca tinha visto tanta gente em cadeiras de rodas, amputados ou pessoas com deficiências físicas e mentais nas ruas. Eu respondi que não é que aqui tem mais, o que acontece é aqui as pessoas com alguma deficiência – ou debilitadas –  tem uma vida normal. No Brasil, por exemplo, essas pessoas estão trancadas em casa por absoluta falta de infraestrutura. E mais: por absoluta falta de educação.

Na Suíça os deficientes e os que precisam de cadeiras de rodas para se locomover são integrados no dia a dia. Primeiro porque eles podem. Existe uma infinidade de tratamentos, fisioterapias, fonoaudiologia, escolas e trabalhos especiais que ajudam a desenvolver ou amenizar as dificuldades cotidianas dos deficientes e dos debilitados por doenças. Quem usa cadeira de rodas – algumas cadeiras suíças parecem um foguete cheias de recursos tecnológicos – tem acesso a todos os lugares. O transporte público é super equipado. Os ônibus têm um sistema de rebaixamento, fora as rampas que se abrem automaticamente ou com a ajuda do motorista, que facilita o acesso. Um “hall” dentro do mesmo garante o espaço para os carrinhos de bebê e para as cadeiras de rodas. Existem assentos com cinto de segurança para quem não tem o controle total dos movimentos do corpo.

A Suíça só tem tudo isso por uma razão: educação. Não é por que todo mundo é bonzinho, não, que as pessoas ajudam. Faz parte da vida cotidiana ajudar quem tem alguma deficiência. Já vi muitas vezes deficientes mentais andando de ônibus e apertando sem parar o botão de “parada” ou falando muito alto. Os motoristas não ligam, ninguém liga. Todo mundo compreende. É quase um gesto automático, impensado. As pessoas nem mudam a fisionomia quando ajudam ou são receptivas. É condição de cidadão. Assim como não jogar lixo nas ruas, respeitar os pedestres, as bicicletas, cuidar do patrimônio público e outros atos que fazem alguns lugares mais civilizados do que outros. E assim o “anormal” vira “normal” por que na verdade é normal.

Uma vês por mês minha filha vai numa sessão de cinema para crianças onde eles assistem filmes “alternativos” ou antigos e discutem esses filmes (quando que isso existiria no Brasil?!?) depois. Tem um menino que frequenta o cinema que não tem nem braços, nem pernas. Ele é praticamente cabeça e tronco. Chega sempre no colo da mãe ou numa cadeira de rodas empurrada por um amiguinho.

A primeira vez que minha filha viu esse menino, ela tinha sete anos e ficou completamente desconcertada. Voltou do cinema abalada, fez mil perguntas. Ela não sabia que existia gente sem braço e sem perna. Foi uma descoberta do que é a vida e como as pessoas são diferentes. Eu falei que tem milhares de pessoas assim no mundo inteiro. Tem gente que nasce assim, tem os que sofrem um acidente, tem os que ficaram assim por uma doença. Também expliquei que as pessoas na vida uma hora ou outra sofrem por alguma coisa. Ficam doentes, são amputadas, perdem alguém, ficam cegas, surdas, tremendo, não conseguem mais andar sozinhas…. e no fim o que é importante é saber que cada um é cada um e respeitar todo mundo. E que esse menino do cinema pode ser um menino feliz por que, além de contar com uma infraestrutura fantástica; parece receber muito amor da família e dos amigos.

Outras sessões vieram e o menino sempre presente. Passado o impacto da descoberta de uma vida diferente, as crianças foram se acostumando. Se acostumaram tanto que ninguém nem olha mais para o menino. Ele foi totalmente integrado e passou, mesmo sendo diferente, a ser igual. Outro dia eu perguntei para minha filha se o menino ainda ía no cinema. Ela respondeu: “ Claro! Tem sempre filme legal. Na última vez ouvi as gargalhadas dele bem altas!”.

 

Zivilisierte Gesellschaft

Ein Mann machte im Schwimmbad eine Reihe Übungen mit Hilfe einer kleinen Boje, welche um seinen Rumpf gebunden war. Nach den Übungen stützte er sich am Rande des Beckens auf seine Arme. Testete, ob er genügend Kraft hat, um sich aus dem Becken zu ziehen. Glitt dann aber wieder zurück ins Wasser. Er wiederholte das Ganze noch zweimal. Der Mann war wohl um die 70 Jahre alt. Sein Kopf war hochrot und mit der Kraft seiner beiden Arme bewegte er seinen Körper, der noch immer durch die Boje gestützt wurde, meerjungfrauenähnlich aus dem Wasser. Danach blieb er einen Moment am Rand des Beckens, um sich richtig hin zu setzen. Er musste all seine Kraft aufwenden, um sich dann auf die Holzbank, die sich entlang des Beckens zieht, setzen zu können. Nun atmetet er mehrmals tief durch und dehnte dabei seine Arme. Den Stumpf des amputierten Beines trocknete er zuerst, danach auch das gelähmte Bein. Nun trocken, zog er den Rollstuhl zu sich hin und schwang sich mit aller Kraft von der Bank hinein. Dann ging er.

Das passierte gestern im Schwimmbad von Wettingen. Für die Schweiz ist das eigentlich eine ganz gewöhnliche Sache. Wenn ich hier etwas bewundere, so ist es die Zugänglichkeit zu und für alles. Einmal sagte wir eine Brasilianerin, dass sie noch nirgendwo so viele Menschen im Rollstuhl oder mit sonstigen Behinderungen auf den Strassen gesehen hat, wie hier. Ich sagte, es sei nicht etwa so, dass es hier davon überdurchschnittlich viele gibt, sondern, dass diese Menschen hier einfach ein normales Leben leben. In Brasilien beispielsweise leben diese Menschen mehrheitlich in ihren vier Wänden, ganz einfach, weil die Infrastruktur überall fehlt. Und mehr: Auch wegen dem fehlenden Respekt.

In der Schweiz sind die Behinderten im gesellschaftlichen Leben integriert. Grundsätzlich auch einfach darum, weil es hier möglich ist. Es gibt eine Vielzahl von Behandlungen, Physiotherapie, Phonoaudiologie und spezielle Schulen, wo die Behinderten oder durch Krankheit geschwächten Menschen lernen, die täglichen Schwierigkeiten zu bewältigen. Wer auf einen Rollstuhl angewiesen ist, hat Zugang zu (praktisch) allen Orten. Einige Rollstühle hier gleichen Raketen, technologisch mit zahlreichen Feinheiten ausgerüstet. Der Öffentliche Verkehr ist hervorragend ausgestattet. Die Busse haben, ganz abgesehen von den Rampen, die automatisch ausfahren, ein Schwenksystem, wobei der Bus an den Haltestellen sich gegen die Fahrgäste nach unten neigen kann und so das Einsteigen erleichtern. In der Mitte des Busses sind separate “Räume”, die für Kinderwagen oder Rollstühle reserviert sind. Auch gibt es spezielle Sitze, die mit Sicherheitsgurten ausgestattet sind, dies für diejenigen, die nicht mehr über die volle Kontrolle ihres Körpers verfügen.

Die Schweiz hat dies aus einem Grund: dem anerzogenen Respekt. Nicht weil alle so nett sind, nein, es ist, weil sie es so gelernt haben. Es ist einfach Teil des Lebens, denjenigen zu helfen, die eine Behinderung besitzen. Ich habe schon oft geistig Behinderte alleine im Bus mitfahren sehen, die ohne Unterbruch den Halteknopf drückten oder unentwegt sehr laut sprachen. Weder Fahrer noch Fahrgäste reagieren, es stört niemanden. Alle haben Verständnis. Es ist fast schon ein automatischer Reflex. Die Leute ändern nicht einmal ihren Gesichtsausdruck, derart schon sind sie daran gewöhnt. Eine Konditionierung der Einwohner. Genauso, wie sie es gelernt haben, keinen Abfall auf die Strassen zu werfen, Fussgänger oder Velofahrer zu respektieren, dem Öffentlichen Eigentum Sorge zu tragen und andere Haltungen, die diese Orte zivilisierter machen als andere. So wird dann auch das “Abnormale” normal, ganz einfach darum, weil es in Wahrheit auch normal ist.

Einmal im Monat geht meine Tochter an eine spezielle Kindervorstellung ins Kino. Es gibt “alternative” Filme und diese Filme werden mit den Kindern besprochen (wäre dies nicht auch in Brasilien möglich?!?). Ein Junge ohne Arme und Beine ist auch immer mit dabei. Er besteht praktisch nur aus Kopf und Rumpf. Er kommt immer getragen von seiner Mutter oder in einem Rollstuhl, geschoben von einem seiner Freunde.

Als meine Tochter ihn das erste Mal sah war sie knapp sieben Jahre alt und danach sehr beunruhigt. Sie kam sehr aufgewühlt von der Vorstellung zurück, hatte tausende von Fragen. Sie wusste nicht, dass es Menschen gibt, die weder Beine noch Arme besitzen. Es war eine Erleuchtung, wie das Leben sein kann und wie Menschen unterschiedlich sein können. Ich erklärte, dass es Tausende solcher Menschen gibt auf dieser Welt. Sagte, es gebe Menschen die werden so geboren, andere erleiden einen Unfall und wieder andere werden durch eine Krankheit so. Ebenso erklärte ich, dass alle Menschen während eines Lebens das eine oder andere Mal wegen irgend etwas zu leiden haben. Sie werden krank, müssen einen Körperteil amputieren, verlieren eine geliebte Person, werden blind, taub, beginnen zu zittern, können nicht mehr alleine gehen… und am Ende sei es wichtig zu wissen, dass ein jeder anders ist und man alle so respektieren muss, wie sie sind. Und dieser Junge vom Kino könne doch auch glücklich sein, hat er hier doch neben der guten Infrastruktur auch eine ihn liebende Familie und gute Freunde.

Es gab noch viele andere Kinovorstellungen und immer war der Junge dabei. Nach der Entdeckung der Vielfalt des Lebens gewöhnten sich die Kinder schnell an Jungen ohne Arme und Beine, so sehr, dass heute niemand nicht einmal mehr hinsieht. Auch wenn er etwas anders ist, so wurde er voll und ganz in diese Kinogemeinde integriert und zu einem normalen gleichwertigen Mitglied. Anderntags fragte ich meine Tochter, ob denn eben dieser Junge immer noch die Vorstellungen besucht. Sie sagte: “Klar! Gibt ja immer tolle Filme. Letztes Mal lachte er ganz laut!”