Maludula quase não se vê. Primeiro porque pouco sai à rua. Segundo porque quando sai está coberta de pano até o chão. Sobra o rostinho redondo emoldurado por mais uma camada de tecido preto. Abdulahh está sempre na rua. Não fala com ninguém. Primeiro porque não fala alemão. Segundo porque não quer, anda rápido, olha pra lugar nenhum e não diz bom dia pra ninguém. Moram no predinho cinza mais feioso do bairro, o de janelas pequenas, No verão enchem a escadinha lateral de gerânios, no inverno ninguém os vê. Vieram do Afganistão, ninguém sabe como o que faz parte do bairro acreditar que são terroristas e outra parte, milionários fugitivos. São refugiados políticos e como refugiados têm suas histórias bem guardadas.
O grupo se encontra no território da igreja católica que cede seu espaço para organizações de meninas (e meninos) mais velhas realizarem atividades com as mais novas. Desde brincadeiras, jantares (elas aprendem a cozinhar, graças a deus!), teatro, shows de música, artesanato até a introdução de atividades de cidadania (recolher papel, lixo, reciclar vidros, pets etc).
“Seria bom pra sua filha participar pra aprender a Língua. Essas atividades socializam e funcionam como aulas extras de alemão”
” She don’t go. She don’t go. Muslim, muslim, muslim”
“Mas não tem nada a ver com religião. É só que a igreja cede a infra deles pras garotas. Tem meninas de todos os lugares e de todas as religiões, inclusive as sem religião.”
“Ah… this is not good, not good”.
Ele cedeu e a menina acabou sendo liberada. Dois anos depois,quando todas fizeram o teste para poder pilotar bicicleta no trânsito, ela apareceu de cabeça baixa. “Não posso fazer o teste, não tenho bicicleta”. “Não tem problema”. Ela foi embora de cabeça baixa,
Uma semana depois apareceu toda feliz e orgulhosa com uma bicicleta semi nova mas tão valorizada como uma novíssima e cara costuma ser . As meninas fizeram uma vaquinha ( e a igreja completou… mas isso a gente não disse pro pai).
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